PESQUISA EM ARTES CÊNICAS – PAC/2007
Professor Cláudio Cajaíba
Aluna Jussilene Santana
SEBEOCK, T. e SEBEOCK, J. Você conhece meu método. In O Signo de Três / Umberto Eco e Thomas A. Sebeock; Tradução Silvana Garcia. São Paulo: Perspectiva, 2004 (Série Estudos 121).
Os autores iniciam este segundo capítulo do livro O Signo de Três, Você conhece meu método, com o relato da história de investigação protagonizada por Charles Sanders Peirce em 1879 (escrita em 1907 e publicada em 1929). O filósofo teria embarcado no vapor Bristol, de Boston para Nova Iorque. Com o sumiço de seu relógio nas dependências da embarcação, ele intima todos os empregados “de cor” para uma conversa. E, apenas neste diálogo, ele identifica o ladrão. “Não foi capaz no nível consciente de dizer como”, destacam os autores, sobre o método utilizado por Peirce.
Tal história é aqui utilizada como uma ilustração da teoria de Peirce “de que as pessoas fazem suposições corretas de modo freqüente”. A este singular instinto de suposição, de cogitar hipóteses corretas sobre acontecimentos, Peirce se refere como abdução. “Realizo uma abdução quando procuro expressar em uma sentença algo que vejo. A verdade é que todo edifício de nosso conhecimento é uma estrutura emaranhada de puras hipóteses, confirmadas e refinadas pela indução” (PEIRCE apud SEBEOCK, 20).
Contudo, ficamos com a questão: se todo conhecimento depende da formação de uma hipótese, no entanto parece que, a princípio, não há nenhum espaço para a questão de como isso se sustentaria, uma vez que, de um fato real, apenas se insere um pode ser (e pode não ser). Ressalte-se que, para Peirce, a freqüência de que a hipótese é verdadeira é de fato surpreendente. “Um dos maiores prodígios do universo” (idem).
Peirce, a partir daí, compara nossa capacidade de abdução com os poderes musicais e aeronáuticos dos pássaros. Seria então “o mais elevado dos nossos poderes instintivos”. Os autores destacam que Peirce nota que a abdução se funda na confiança de que há suficiente afinidade entre a mente do raciocinador e a natureza para tornar a suposição algo afiançável, uma vez que cada suposição é confrontada com a observação através da comparação. De fato, não haveria “nenhuma garantia em fazer algo mais do que colocar (uma abdução) como interrogação” (21).
Ainda retomando Peirce, os autores destacam que a abdução seria um meio de comunicação entre o “Homem e seu criador”, um privilégio divino que deve ser cultivado. Retomando a doutrina das possibilidades, seria praticamente impossível supor uma causa por puro acaso. O que ocorreria então? Com mais ênfase, para Peirce não haveria “dúvida sobre o fato da mente do homem, tendo se desenvolvido sob a influência das leis da natureza e, por isso, pensar naturalmente segundo o padrão da natureza”. Se não houvesse ela luz interior, segundo Peirce, a raça há muito estaria exterminada.
Peirce levanta então dois princípios: O primeiro, que a mente humana, como resultado dos processos naturais de evolução, é predisposta a fazer suposições corretas sobre o mundo. O segundo (que explica parcialmente o fenômeno da suposição), afirmaria que frequentemente retiramos da observação fortes sugestões de verdade, sem sermos capazes de especificar quais foram às circunstâncias por nós observadas que conduziram a estas sugestões. Ainda para Peirce, os processos pelos quais configuramos intuições sobre o mundo dependem dos julgamentos perceptivos, os quais contem elementos genéricos que permitem que proposições universais deles possam ser deduzidas. Tais julgamentos perceptivos são o resultado de um processo, embora não suficientemente consciente para ser controlado. Os diferentes elementos de uma hipótese estariam em nossa mente antes que conscientemente a cogitemos.
Cabe ressaltar que não haveria uma linha clara entre julgamento perceptivo (não sujeito a análise lógica) e inferência abdutiva. Para Peirce, abdução “ou o primeiro degrau do raciocínio científico”, único argumento que inicia uma nova idéia, é um instinto que confia na percepção inconscientemente das conexões entre aspectos do mundo.
Os autores ressaltam a notável semelhança entre o relato de Peirce e as descrições do método do detetive Sherlock Holmes, descritos pelo Dr. Watson, nos célebres romances de Arthur Conan Doyle. Destacam, inclusive, os apelidos a Holmes de “cão perdigueiro”, farejador, algo similar a um instinto. O curioso é que o investigador da ficção diz que o que ele faz não é suposição. Mas é.
Daí que, segundo Holmes e também para Peirce, as melhores hipóteses a serem consideradas, seriam: a mais simples e natural; a mais fácil e menos dispendiosa de ser checada; e a que contribui para compreensão do espectro maior de fatos possível. Enfim, as suposições mais razoáveis a se fazer nas circunstâncias dadas. Para Peirce, contudo, toda hipótese deveria sempre ser considerada como pergunta. E, embora acredite que todo conhecimento novo surja de conjecturas, eles seriam inúteis sem o leste de averiguação.
Também Holmes, segundo os Sebeock, reconhece a natureza mais “perigosa” da hipótese, quando defende o uso da imaginação, da intuição e da especulação. Um puro jogo (34).
No subcapítulo Doença, crime e semiótica, relembra-se que as raízes da semiótica estão fundadas em antigos tratados médicos. Para Peirce, as ciências se desenvolvem das artes utilitárias. Outra semelhança: Peirce um curioso da medicina e Doyle, autor de Holmes, um médico. Por sua vez, este teria se inspirado em Joseph Bell, seu professor na faculdade de medicina. Daí as afirmações provocativas para a área das ciências médicas: “um diagnóstico nunca é absoluto rigoroso”, “a medicina é uma pseudociência” e a “a doença é um conjunto de sintomas” (47)
Professor Cláudio Cajaíba
Aluna Jussilene Santana
SEBEOCK, T. e SEBEOCK, J. Você conhece meu método. In O Signo de Três / Umberto Eco e Thomas A. Sebeock; Tradução Silvana Garcia. São Paulo: Perspectiva, 2004 (Série Estudos 121).
Os autores iniciam este segundo capítulo do livro O Signo de Três, Você conhece meu método, com o relato da história de investigação protagonizada por Charles Sanders Peirce em 1879 (escrita em 1907 e publicada em 1929). O filósofo teria embarcado no vapor Bristol, de Boston para Nova Iorque. Com o sumiço de seu relógio nas dependências da embarcação, ele intima todos os empregados “de cor” para uma conversa. E, apenas neste diálogo, ele identifica o ladrão. “Não foi capaz no nível consciente de dizer como”, destacam os autores, sobre o método utilizado por Peirce.
Tal história é aqui utilizada como uma ilustração da teoria de Peirce “de que as pessoas fazem suposições corretas de modo freqüente”. A este singular instinto de suposição, de cogitar hipóteses corretas sobre acontecimentos, Peirce se refere como abdução. “Realizo uma abdução quando procuro expressar em uma sentença algo que vejo. A verdade é que todo edifício de nosso conhecimento é uma estrutura emaranhada de puras hipóteses, confirmadas e refinadas pela indução” (PEIRCE apud SEBEOCK, 20).
Contudo, ficamos com a questão: se todo conhecimento depende da formação de uma hipótese, no entanto parece que, a princípio, não há nenhum espaço para a questão de como isso se sustentaria, uma vez que, de um fato real, apenas se insere um pode ser (e pode não ser). Ressalte-se que, para Peirce, a freqüência de que a hipótese é verdadeira é de fato surpreendente. “Um dos maiores prodígios do universo” (idem).
Peirce, a partir daí, compara nossa capacidade de abdução com os poderes musicais e aeronáuticos dos pássaros. Seria então “o mais elevado dos nossos poderes instintivos”. Os autores destacam que Peirce nota que a abdução se funda na confiança de que há suficiente afinidade entre a mente do raciocinador e a natureza para tornar a suposição algo afiançável, uma vez que cada suposição é confrontada com a observação através da comparação. De fato, não haveria “nenhuma garantia em fazer algo mais do que colocar (uma abdução) como interrogação” (21).
Ainda retomando Peirce, os autores destacam que a abdução seria um meio de comunicação entre o “Homem e seu criador”, um privilégio divino que deve ser cultivado. Retomando a doutrina das possibilidades, seria praticamente impossível supor uma causa por puro acaso. O que ocorreria então? Com mais ênfase, para Peirce não haveria “dúvida sobre o fato da mente do homem, tendo se desenvolvido sob a influência das leis da natureza e, por isso, pensar naturalmente segundo o padrão da natureza”. Se não houvesse ela luz interior, segundo Peirce, a raça há muito estaria exterminada.
Peirce levanta então dois princípios: O primeiro, que a mente humana, como resultado dos processos naturais de evolução, é predisposta a fazer suposições corretas sobre o mundo. O segundo (que explica parcialmente o fenômeno da suposição), afirmaria que frequentemente retiramos da observação fortes sugestões de verdade, sem sermos capazes de especificar quais foram às circunstâncias por nós observadas que conduziram a estas sugestões. Ainda para Peirce, os processos pelos quais configuramos intuições sobre o mundo dependem dos julgamentos perceptivos, os quais contem elementos genéricos que permitem que proposições universais deles possam ser deduzidas. Tais julgamentos perceptivos são o resultado de um processo, embora não suficientemente consciente para ser controlado. Os diferentes elementos de uma hipótese estariam em nossa mente antes que conscientemente a cogitemos.
Cabe ressaltar que não haveria uma linha clara entre julgamento perceptivo (não sujeito a análise lógica) e inferência abdutiva. Para Peirce, abdução “ou o primeiro degrau do raciocínio científico”, único argumento que inicia uma nova idéia, é um instinto que confia na percepção inconscientemente das conexões entre aspectos do mundo.
Os autores ressaltam a notável semelhança entre o relato de Peirce e as descrições do método do detetive Sherlock Holmes, descritos pelo Dr. Watson, nos célebres romances de Arthur Conan Doyle. Destacam, inclusive, os apelidos a Holmes de “cão perdigueiro”, farejador, algo similar a um instinto. O curioso é que o investigador da ficção diz que o que ele faz não é suposição. Mas é.
Daí que, segundo Holmes e também para Peirce, as melhores hipóteses a serem consideradas, seriam: a mais simples e natural; a mais fácil e menos dispendiosa de ser checada; e a que contribui para compreensão do espectro maior de fatos possível. Enfim, as suposições mais razoáveis a se fazer nas circunstâncias dadas. Para Peirce, contudo, toda hipótese deveria sempre ser considerada como pergunta. E, embora acredite que todo conhecimento novo surja de conjecturas, eles seriam inúteis sem o leste de averiguação.
Também Holmes, segundo os Sebeock, reconhece a natureza mais “perigosa” da hipótese, quando defende o uso da imaginação, da intuição e da especulação. Um puro jogo (34).
No subcapítulo Doença, crime e semiótica, relembra-se que as raízes da semiótica estão fundadas em antigos tratados médicos. Para Peirce, as ciências se desenvolvem das artes utilitárias. Outra semelhança: Peirce um curioso da medicina e Doyle, autor de Holmes, um médico. Por sua vez, este teria se inspirado em Joseph Bell, seu professor na faculdade de medicina. Daí as afirmações provocativas para a área das ciências médicas: “um diagnóstico nunca é absoluto rigoroso”, “a medicina é uma pseudociência” e a “a doença é um conjunto de sintomas” (47)
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